Café bom é café fresco: Dicas de compra e armazenamento

por Maria Mion

Desde a origem do pensamento sobre café especial, nos idos dos anos sessenta (quando esse nome ainda nem existia), Alfred Peet, o pioneiro do movimento do café especial, dizia que para oferecer um café de qualidade era preciso encurtar a distância entre quem torra e quem consome. Peet estava pleno de razão quando afirmava ser o frescor a base fundamental do conceito de qualidade.

https://twitter.com/peetscoffee/status/972496306093608961/photo/1
Fontes das imagens: Alfred Peet / logo 

Por isso é impossível falar sobre qualidade e frescor sem abordar três tópicos: data de torra, moagem e armazenamento. Abaixo listo alguns ensinamentos e dicas valiosas para você aproveitar ao máximo a qualidade do seu café.

Data de torra

O grão de café é a semente de uma fruta. Para que possamos transformar essas sementes em bebida elas precisam ser torradas. Após o processo de torra as sementes, ou grãos de café, entram num processo de oxidação acelerado. Isso significa que os aromas e sabores estão sendo perdidos com o passar do tempo e a cada momento que entram em contato com o ar.

Foto Maria Mion

Mas os grãos ainda são capazes de segurar esses aromas e sabores por um período de tempo, que costuma ser de 30 a 60 dias. Esse tempo poderá ser mais curto ou extenso dependendo de uma série de fatores como: armazenamento, perfil de torra, densidade e qualidade dos grãos, além do frescor das sementes ainda verdes (mas isso tudo é papo para ouuutros textos). O mais importante é sabermos quando esse café foi torrado, essa informação deve estar na embalagem.

Embalagens da esquerda para a direita, de cima para baixo: Lucca, Flama, Moka Clube, Café é uma doidera bixo, Kaffe e La Cabra. Fotos Maria Mion

A data de torra é um bom indicativo sobre o frescor, se este café ainda está gostoso ou se já perdeu boa parte do que tinha pra oferecer. Veja, o café é um alimento considerado não-perecível, o que significa que você pode consumi-lo em um período de tempo prolongado sem prejudicar sua saúde, porém ele perderá a complexidade de aromas e sabores, ficando sem graça e até mesmo rançoso. Isso é o que chamamos de café velho.

Moagem

Sabe aquela fragrância deliciosa de café recém-moído? Então, sentir esse cheiro significa que boa parte dos deliciosos sabores, que queríamos sentir na nossa bebida, estão se dispersando pelo ar.

Foto Maria Mion

O grão de café contém milhares de micro cavidades entre suas fibras onde aromas e sabores são retidos. Quando moemos o café, transformamos esse grão em pó, expondo essas cavidades e aumentando a superfície de contato com o ar, acelerando exponencialmente a oxidação dos grãos. Mas sabemos que não temos como filtrar o café se ele não passar pelo processo de moagem, por isso o ideal é moer apenas quando formos prepará-lo, essa é mais uma maneira de assegurar frescor e qualidade a bebida.

https://handground.com/grind/an-intuitive-guide-to-coffee-solubles-extraction-and-tds
Imagem microscópica – corte transversal de um grão de café torrado e visão ampliada 750x
Fonte das imagens: Hand Ground

Armazenamento

Tudo sobre armazenamento correto dos grãos de café tem a ver com oxidação. Então é importante que entendamos o que é oxidação. Sabe quando cortamos uma maçã ou batata e logo fica escura? Oxidação. Ou quando abrimos um vinho, não bebemos inteiro e decidimos bebê-lo depois de alguns dias e ele fica com sabor de vinagre? Oxidação.

Oxidação é deteriorização e a causa do envelhecimento desses alimentos citados. Acontece por decorrência do contato de alguns compostos orgânicos com o ar.

O café é composto em grande parte por óleos que são deteriorados em contato com o ar, umidade, calor e luz. A oxidação desses óleos do café causa transformações químicas que modificam seu aroma e sabor, causando assim uma perda de frescor. Logo, precisamos manter nosso café em um recipiente opaco, muito bem vedado e longe de fontes de umidade e calor.

E sobre guardar café na geladeira? Essa é uma dúvida recorrente, pois algumas embalagens de cafés tradicionais orientam o armazenamento em geladeira. Esqueça essa orientação, lembre-se que a umidade é uma das 4 inimigas do café, além de que, os grãos, por serem muito porosos, absorvem o aroma que estiver por perto. Já pensou que delícia um cafézinho com sabor de cebola?

De forma objetiva posso dar algumas dicas:

  • Mantenha o café na embalagem que você comprou. Provavelmente é uma boa embalagem, quem torrou seu café já se preocupou com isso.
  • Durante o preparo diário, quando fechar a embalagem, tire a maior quantia de ar que conseguir, assim você minimiza o contato dos grãos com o oxigênio.
  • Caso seja uma embalagem maior que de 250g, de meio quilo ou 1kg, eu recomendo você porcionar os grãos em 2 ou 3 partes e manter essas embalagens seladas até o uso, se você tiver uma seladora à vácuo, melhor ainda.
  • Se você investiu em um pote hermético bonitão, lembre-se, o ideal é que ele não seja transparente, pois o contato dos grãos com a luz é prejudicial. Mas nem tudo está perdido, você pode utilizar esse pote para armazenar os grãos dentro da embalagem que eles já estão, funcionando como uma vedação extra.

 Café bom é café fresco e compartilhado

 Por último, a melhor dica que posso dar sobre frescor é: entenda o seu consumo de café e compre apenas o necessário, assim você terá grãos frescos sempre. Aproveite as idas às suas cafeterias favoritas e peça indicações aos baristas, sobre grãos disponíveis à venda ou onde encontrar grãos de qualidade. Se o seu consumo é pequeno e você deseja ter diversos perfis de cafés à disposição a melhor saída são compras coletivas com os amigos. Ou ainda, no caso de uma viagem, quando voltar com quilos de cafés diferentes, seja uma ótima pessoa, porcione os cafés comprados e presenteie amigos, sem esquecer do seu barista favorito, aposto que todos vão adorar conhecer e debater sobre esses novos sabores com você!

Referências bibliográficas:

The Coffee Cupper’s Handbook – Systematic Guide to the Sensory Evaluation of Coffee’s Flavor – Ted R. Lingle

The Craft and Science of Coffee – Britta Folmer

Everything but Espresso – Scott Rao

The Professional Barista’s Handbook: An Expert Guide to Preparing Espresso, Coffee, and Tea – Scott Rao

Coffee with Tim Wendelboe – Tim Wendelboe

Revisão de texto

Amanda Lôbo e Pablo Campos.